ESCRAVOS DA ÁFRICA PARA O BRASIL 1793 - PARTE 01

Transcrição do livro acima retratado em foto:

"Tirada pois pelo comum a escravatura do mau trato de todos os outros Comissários, e sendo segunda vez permutada para o embargue, sem preceder disposição, ou convalescença alguma; os novos senhorios da escravatura, que a embarcam, deveriam ter pelo menos as precauções seguintes:

I

Deveriam ter por primeira cautela de transportar melhor escravatura, embarcar menor número dela: tanto porque a coberta viria mais desafogada dela, como porque seria a mesma escravatura mais bem suprida de mantimentos, e aguadas; sem que continuasse a experimentar novas fomes, e sêdes por efeito de uma escassa ração, e de uma escassa medida de água, que de vinte em vinte e quatro horas se lhe dá. Porém este sistema tão humano, e tão conforme à razão, até concordante com os próprios interesses, pois muitos mais escravos vinham a salvar, não pois que muitos mais escravos vinham a salvar, não lhes pode agradar, porque o seu fim só é o embarcarem muitos; onerando o navio com mais praças, do que na realidade ele pode: sem entrarem no desconto, que embarcando muitos, muitos também lhes morrem, e abafando uns a outros, enfermam; e ainda aqueles mesmos, que vêm a ficar salvos, para sempre se conservam enfezados, e doentes, vindo em terra a falecer, ou em poder, e casa do senhor da negociação, ou em poder do terceiro, que os compra.

II-

Para se obviar tamanho estrago, deveriam ter a providência de fazer embarcar não só bons mantimentos, mas também estes em abundância, quanta precisa fosse para fartar os escravos; porém assim não sucede, porque de ordinário os mantimentos da escravatura vêm a ser de torna-viagem, e avariados, que, seguindo o mais barato, se compraram nos Portos da América já com este intento. Se acaso porém os Capitães dos navios, diretores desta infeliz negociação, alguns mantimentos compraram em os Portos Maritimos da África para o sustento da escravatura, que embarca, sempre vêm a ser os mais ínfimos, aproximados aos mantimentos, de que temos falado. A desgraçada escravatura a um tempo vem a sentir dois males: primeiro, a fome proveniente de uma escassa ração: segundo, o de ser esta, além de mantimentos, que lhe são estranhos, e mal temperados, de má qualidade, e por tudo isto danosa à saúde.

III-

Se aqueles mesmos Capitães , entrando no capricho cordato de quererem pôr salva no transporte a escravatura, aplicassem os meios necessários, eles teriam por terceira providência fazer meter em o navio maior porção de tonéis com aguada, o que lhes não custava muito, para saciarem frequentemente as continuadas sêdes da mesma escravatura, aumentadas por muitos, e diversos modos: primeiro, por causa do peixe salgado, que lhe cabe em ração: segundo:, porque vem abocetada em uma coberta, em que ela está em um perene suor: terceiro pela ardência do clima, e da estação em que é transportada."

NOTA: brevemente daremos continuidade à esses registros históricos.